sexta-feira, 27 de abril de 2018

Parte 2.

E não era minha boca quem sorria apenas, era o meu espírito que já não compreendia a vida da mesma forma, eu agora não usava a mesma plataforma. Fui entrando cada vez mais na minha existência e desejei intensamente saber quem eu era, e eu ainda não sei, o que eu sei é quem eu não sou, e quem eu não quero ser. Em 2014 mudamos para uma casa grande, espaçosa, meu marido se olhou no espelho sem barba e não reconheceu mais a sua vida, pediu a conta do seu trabalho, e fomos para o pilarzinho, neste bairro começamos outra história. Mas antes deste dia chegar, eu voltei pra Corbélia de férias, e numa noite inesquecível, na casa da minha irmã mais velha, eu bebi todo o vinho que meu cunhado tinha com ele e outra irmã mais nova, e em francês consegui expor toda a dor que me espremia. Foi nessa noite que eu vi no brilho dos olhos da minha irmã algo que antes ela não tinha, exatamente naquele dia, dentro do seu ventre germinava a semente que eles tanto queriam. Foi naquele dia que a Laura apareceu pela primeira vez na minha vida, através dos olhos da minha alma gêmea nesta vida.

No triplex, eu ganhei meu primeiro animal de estimação, ele me foi trazido por uma amiga querida, e cheia de alquimia. O gatinho Chicó trouxe com ele a alegria que eu não conhecia, e o amor ao reino que eu ainda não fazia ideia de como me mudaria. Com uma semana de convivência com o Chicó eu me tornei vegetariana. Eu amei aquele ser com tanta intensidade, que me choquei com a doação que fiz a alguém que não fosse eu mesma. Assim como chegou, o Chicó se foi, e comigo deixou a certeza de sua missão, concretizei um desejo e uma certeza que há muito tempo eu já cultivava dentro da minha consciência, o vegetarianismo não é apenas uma causa, é uma exigência, é uma ascensão do ser humano que precisa ser alcançada por todos aqui na terra. Quando você aqui na terra aprender a redirecionar o seu olhar para a existência no mundo, você não comerá mais os animais. E foi olhando para aquele ser frágil e selvagem que era o Chicó, que não pude mais comer carne, eu sentia que o desrespeitava, e o amor que eu senti por ele se estendeu a todos os seres deste mundo. Eu entendi pela primeira vez o quanto éramos tolos em comer nossos irmãozinhos de diferentes corpos. Me senti canibal, e percebi que realmente o era se entendia que Chicó era o meu igual. Aaai Chicó, sua passagem merecia muitas linhas, me ensinou tanto em tão pouco. E foi com o professor Laercio que obtive as explicações para todas essas sensações e experiências que vieram em doses cavalares em 2014, 2015, 2016 e 2017 e me transformaram em um novo ser. O professor Laercio é um astrofísico, médium, e extremamente consciente e iluminado, só ele conseguiu me trazer explicações razoáveis através de suas palestras gratuitas no youtube. As teorias que ele expõe com total clareza, eram certezas que eu tinha e não encontrava ninguém que as dividia, a forma racional e coerente que ele divide as suas certezas, são hoje um guia que eu mantenho sempre ao alcance da minha mão.
Foi em 2014 que comecei um processo que só encerrei este ano de 2018.
A palavra que eu mais ouvi em 2014 foi, GRATIDÃO.

Vozes: Baden pawell, Françoise Hardy, David Bowie, Los hermanos, Belchior, Céu, Lenine.

2015. Esse foi com certeza o ano em que eu mais curti estar viva, consciente e livre para fazer com o meu tempo o que eu sentia vontade, criar. O apartamento no centro foi uma morada incrível, onde recebemos muitas pessoas de vários cantos do Brasil, e além do Brasil. Lá construímos memórias dignas de um longametragem, mas o momento e a expansão da consciência pediam um lugar mais tranquilo e amplo, era impossível expandir qualquer coisa naquela caixa de sapato tão querida. Foi quando nos mudamos pro triplex de um amigo mais que querido no pilarzinho. Lá era meu paraíso, eu vivi naquela casa um dos meus últimos desejos da juventude curitibana, morar com amigos e criar um ambiente de criatividade artística intensa. Com influência da casa amarela da Frida kahlo, me imaginava sendo a mantenedora de um lar que fosse aberto aos público, a casa eu tinha, os amigos também, só faltava o público. E foi em uma guinada totalmente contrária do que eu vinha experimentando, que eu pude viver o último ano de forma renovadora em Curitiba.  Primeiramente, estávamos longe do barulho, das multidões do centro, dos museus, dos teatros, e morando ao lado de todos os parques do norte da cidade. O ar era refrescante, e a vizinhança silenciosa, os pássaros e os cachorros fizeram nossas primeiras noites impossíveis, depois nos acostumamos com a nossa vizinhança e tudo fluiu de forma tranquila e harmoniosa.Tinha uma roseira e um pé de tomate deixados pela antiga dona da casa, e minha varanda do quarto era sombreada por uma arvorezinha amigável, que se enchia de flores amarelas e abelhinhas na primavera. Se o ap do centro foi cena de filme, o triplex foi uma pintura de Van Gogh. Sem conhecer ainda a obra de Van Gogh na época como conheço hoje, pintamos a cozinha de amarelo, porque era a cor do meu momento, de renascimento e luz, e sentimentos extremos. Nossa casa foi arrumada de forma que tudo remetia ao desejo de produzir arte. As nossas amigas a Isa já mencionada e a Rafa, uma libriana de campinas, amiga de infância da Isa, vieram morar temporariamente  conosco. Elas dividiram um quarto da nossa maison, por três intensos meses. Foi um período de muitos sentimentos e experiências, eu me sentia totalmente desapegada no começo, não me importava de dividir tudo com todos. Eu e o Arnoldo fomos muito felizes no período em que estivemos com elas, e as nossas noites eram quase sempre animadas, e encorajavam debates debaixo do céu estrelado e negro, como eu não havia visto ainda em Curitiba.
As meninas eram vegetarianas, e isso facilitou muito nosso convívio, o que não facilitou não importa, somos todos seres defeituosos, mas o amor prevalece sempre acima de qualquer infortúnio. E nós vivemos amorosamente com nosso gato Chicó, com a Rafa e a Isa, e nossos amigos das estrelas que eram assunto pra madrugadas regadas a cerveja, vinho, muita música, loguka e
ás vezes marijuana. Cada um sabe o que desperta a sua fala, pra mim o vinho é batata. Fizemos muitas festinhas de natal no sótão e na cozinha, e para isso não tinha dia. Quando um estava em baixa, o outro sempre trazia regalias, e nem preciso dizer que o Arnoldo muitas vezes se cansava das nossas filosofias. Éramos três jovens fêmeas com toda uma vida pela frente contra um quase quarentão, cheio de cansaços e responsabilidades que nenhuma de nós conhecia ou concebia. Mas toda a nossa energia servia para restaurar nele a fé na humanidade que ela já quase não via. Nós quatro nos completávamos em nossos espíritos quebrados e em reconstrução, muitas coisas nos unia e desunia, a imaturidade não ajudava muito, mas o amor, a espiritualidade e o respeito, nos mantinha vivos e na maioria do tempo em harmonia.
Neste período criamos muitas coisas, e eu me inspirava como nunca a escrever prosa em detrimento da poesia. Eram dias ensolarados de noites frescas e muitos miados. Com o passar do tempo, nossa casa virou palco de ensaio para a banda da Isa, e isso me excitava, queria viver como Frida, no meio da arte, no meio de espíritos de energia positivas.
E foi neste ano que a Régis se consolidou ainda mais na minha teia de amigos, nossos espíritos se encontraram como nunca, e a admiração que eu tinha por ela, era coisa louca, uma mulher que merece ser aplaudida em pé, sem exageros, uma guerreira que era mastigada pelo mundo e vencia todos os dias. Eu via a Régis nas aulas de literatura, ela era uma pessoa que chamava a minha atenção, entrava e saía com a mesma velocidade, nunca encontrei ela pelos corredores, era visível que sua vida não girava em torno da universidade. E lá em 2013, quando ela ficou sabendo do meu encontro com Oswaldo, ficou alucinada, e se aproximou de mim, como eu jamais preveria. Nossa conexão só aumentou, e todas as barras que ela aguentou, eu a vi enfrentar com maestria. Foi um dos últimos tesouros que Curitiba me deu, e guardo ela no mesmo baú que todas as outras amigas e amigos que conheci nestes sete anos de Curitiba. Foi um casamento longo com a cidade, e em 2015 a crise do país, junto com as transformações que aconteceram nos nossos espíritos e em nossas vidas, vieram por fim ao período até então, de maior transformação e riqueza pessoal que eu jamais havia imaginado em todas as minhas alucinações de adolescente, e ficções literárias. Vivi um ápice de crescimento humano que eu não saberia contabilizar, só posso desejar que meu filho passe por esse movimento um dia.
Depois que as meninas foram embora do triplex em meados de junho, o movimento dos meus dias acabaram, e agora eu tinha mais espaço e tempo para aprofundar minhas experiências espirituais e artísticas introspectivas. E foi assim, que passei a meditar, compor músicas para o novo gato o Peri, e a escrever novamente poesia. Eu me impus uma rotina, acordava cedo, lia, escrevia, me alongava, pesquisava qualquer coisa. E ouvia as palestras do professor Laercio no youtube. O nível de consciência que eu adquiri como ser espiritual nesse ano, é maravilhoso, nunca tinha estado mais consciente da vida do que nesse ano. E ter essa compreensão acalmou mais ainda as minhas expectativas, e a paciência se tornou meu lema e minha sina. Com as meditações antes do meio dia, consegui ter luzes que me inspiraram muito, e me tornaram ainda mais criativa. Em uma dessas meditações visualizei os meus poemas sendo personificados através de performances no youtube, nunca me passou pela cabeça tal ousadia, mas naquele período minha energia estava a toda, e tudo o que remetia à arte eu seguia e não discutia. Sabia que seria apenas uma memória pra mim mesma pra algum dia de baixa estima, e foi revigorante transformar meus poemas em som, e voz, e corpo e máscara. Era a Musa quem falava, eu nunca tinha interpretado, e foi sem nada que fiz isso. Quando lembro da câmera de celular que gravei aqueles vídeos, vejo quanto ousada fui, não sei se repetiria tal anarquia. Mas estão guardados na memória do youtube, e meu filho e sobrinhos rirão disso um dia, quando eu for velha o suficiente pra achar belo esse gesto impetuoso de expor tudo o que eu não saberia ser, toda a minha arte jamais mencionada, jamais reconhecida. Vai ser revigorante e talvez até inspire os jovens e amigos, dos amigos das nossas crias algum dia. Mas as músicas, vídeos, textos e pensamentos que criei naquele ano, no triplex, nas noites sozinhas em que o Arnoldo ia tocar fora da cidade, e por medo de bandidos invadirem a casa, eu tocava violão a noite toda, na companhia do gato Peri, e embriagada pelo sono construía canções e melodias que saíam de alguma parte de mim que em sã consciência parecia inacessível.
Quando no fim de setembro decidimos voltar pra Corbélia, eu já não amava mais Curitiba, dela me divorciara, e sentia raiva por ter nos expulsado, logo agora, que fazíamos auto-hemoterapia todas as quartas, que a feira do bairro tinha as melhores frutas. Que as tardes de domingo na rua São Francisco ofereciam diversão gratuita. Sim, nós já havíamos decorado os quadros pendurados nas paredes do MON, nossos amigos já faziam parte da nossa rotina, e o mapa de Curitiba estava fotografado nas minhas retinas. Foi com tristeza que me despedi de Curitiba, mas não queria ir pra lugar nenhum, nem pra Europa, Floripa, ou qualquer outra cidade que não fosse Curitiba, só pensava em voltar pra casa, eu precisava entender e assimilar todos aqueles anos na terra dos pinhões. Meu espírito estava esgotado e já desejava um lugar mais calmo, uma vida mais simples, e a humildade que eu ainda não sentia, viria mais cedo do que eu previa, mas com uma imensa dificuldade em ser aceita, eu ainda sentia ansiedades que não controlava, ainda era egoísta, ainda me orgulhava de feitos que eram fatos dados, e dos quais eu pouco compreendia. Enfim, a temporada em Curitiba foi um aglomerado de informações que nenhuma pesquisa no google me traria. Cheguei menina, e voltei mulher adulta. Cheia de histórias, e completa pelos amigos que não se esvaziam jamais da minha mente. Persigo seus passos e comemoro suas vitórias. As páginas que escrevi naqueles anos, ainda as leio com a lágrima e o riso pesando sempre do mesmo lado. Nos últimos passos que dei naquele asfalto tão cinza, tão limpo, eu vi minha sombra e não senti pena do que eu não mais veria, eu sabia que outras páginas seriam escritas, não conhecia o conteúdo, mas sempre soube da efemeridade das coisas e da perda dos significados. Tudo tem fim, menos a memória e o espírito que são eternos mesmo quando julgamos acabados.

2016. O ano em que o Caetano finalmente veio.
Em 2012, fomos num médium famoso em Toledo, que nos disse que havia um menininho esperando pra encarnar no meu ombro direito. Em janeiro de 2016, eu e o Arnoldo estávamos em Corbélia, na casa da minha mãe dando um tempo desde outubro de 2015 quando viemos de Curitiba em uma longa viagem de carro, com um gato, uma horta, passando por Floripa e chegando em fim no velho oeste paranaense. Fizemos vários planos, e quando chegamos decidimos que o Arnoldo iria descansar por um tempo e eu depois de janeiro iria atrás de um trabalho. Mas 05 de janeiro transamos sem camisinha no meu período fértil, então, depois de três semanas minha menstruação não veio, e uma semana depois enquanto o Arnoldo fazia uma viagem rápida com meu pai até paranaguá, eu a mando de minha mãe fiz um exame de anemia e outro de gravidez, segundo ela, só um destes dois fenômenos poderiam justificar a minha leseira, eu dizia que era só o calor cozinhando meu corpo, e eis que nesta semana fui entregar currículo em Cascavel nas escolas, no último colégio, o ideal, eu fui chamada para a entrevista, na sexta-feira desta semana, não me recordo o porquê, mas todas as pessoas da minha família se encontravam na casa da minha mãe, às cinco horas minha irmã chegou com o exame, eu abri, quase desfaleci, o Arnoldo só ria, e eu amarela de medo, de insegurança, de descontentamento, e alegria, e euforia, sentei e falei, agora só me falta o emprego. Às cinco e meia da tarde me ligam do ideal dizendo que eu havia conseguido a vaga para professora de espanhol, a qual eu recusei na outra semana quando descobri o valor das aulas que mal pagariam as despesas de ida e volta e alimento. Decidimos então que o Arnoldo iria trabalhar e eu ficaria novamente em casa, agora gestando. gerando a vida dentro de mim na maior tranquilidade possível. E essa foi a revolução com a qual nós não contávamos em nossa vida, não neste momento, fosse dois anos antes, tudo estaria perfeito. Plano de saúde, instalação do bebê, estabilidade financeira, e todas as condições para o sonhado parto humanizado em Curitiba. Mas éramos recém chegados no velho oeste, completamente desavisados do tempo que aqui havia parado. Tudo parecia precário e descompensado. A comida era pavorosa, tudo muito doce, tudo muito salgado. Os vegetais frescos cheiravam agrotóxicos, e o sabor era indecifrável, as ruas eras sujas da poeira acumulada, e da terra vermelha que macha todos os móveis e sapatos. Somado à isso, meus hormônios me enlouqueceram, me desequilibraram como na puberdade, foi o ano em que voltei a me sentir como na adolescência, vivendo em uma cidade sem esperanças, sem perspectivas e com os sentimentos completamente instáveis. A superfície de tudo me parecia impuro, mas eu sabia que era exatamente ali que eu deveria estar naquele momento, sempre planejei ter meus filhos no interior, sempre desejei que tivessem a infância segura e livre que eu tive, assim como a proximidade física com os amigos do bairro. E agora, não havia nada mais que eu queria nesta vida do que ter meu filho ao lado da minha família. E todas as regalias da cidade grande foram sendo esquecidas através do amor da família. Mas tudo fez sentido, todas as privações eram superadas facilmente com a minha florzinha, a Laura. Nós nos amamos intensamente todos os dias durante um ano e alguns meses. Nossa relação vêm de tempos, e todas as manhãs quando aquele ser tão pequenininho chegava na nossa casa, meu peito se derretia e o sono perdia vez. Os dias eram só dela, meu tempo era o seu tempo. Aquele voz tão meiga e desgovernada me acalentavam, e despertavam o Caê de seu templo. Um amor desses, que nos torna cegos, e monopolizados todo o tempo é difícil de ser superado, só o amor de mãe pra equilibrar em seu peito tantos amores ao mesmo tempo. Com a Laura fui aprendendo a ser mãe e tia, e pude realizar meu sonho de transmitir todo a minha teoria materna a ela. Nós duas gestamos o Caê, ela o amou desde o começo. E nós vivemos com intensidade esses noves meses numa casa grande, ensolarada de madeira, com frutas no terreiro e gatos por todos os lados. Foi um inverno passado ao redor do fogão à lenha, com leite direto da vaca e mandioca colhida na horta. Os dias eram tranquilos e esparsos. O único som noturno era o dos meus chinelos no assoalho que, faziam ranger toda a casa com o peso do meu corpo esférico e lento deixando rastros. A gestação foi me acalmando de uma forma que ao final meu equilíbrio já estava restaurado. E no dia sete de setembro a bolsa rompeu, e eu não fiquei em choque nem histérica, apenas continuei com os mesmos lentos passos, até a madrugada, quando fui ao posto, e então transferida para Cascavel. O Caê veio a nascer no dia 08 de setembro no fim do turno de um ótimo médico. Foi cesárea, muito bem conduzida e justificada com a incapacidade do meu colo dilatar mesmo com ajuda da ciência médica. Foi lindo, o Arnoldo corria pela sala cirúrgica segurando o Caê nos braços com o sorriso mais largo e me pedia pra cantar o leãozinho, e eu mal conseguia manter os olhos abertos pra enxergar o filho que coloquei no mundo. Desde esse dia nunca mais dormi uma noite inteira, e os anos foram medidos entre uma mamada e outra, entre uma papinha e outra, os dias não são mais os mesmos, nem o tempo. Levei dois dias pra conseguir conceber esse texto, porque os intervalos são poucos, e a atenção pra ele bastante. Não ouso corrigir esse texto, tudo nele vai ficar imperfeito como a nossa vida parece ser. Confuso, cheio de tropeços, mas com um sentido maior para tudo.
O ano de 2017 foi de transformação novamente. Eu me reinventei, agora mãe, agora mais forte e mais objetiva, sem muitos pretextos, sem muita paciência para nada que não seja o bem estar do meu primogênito. Os motivos do mundo são mesquinhos e intrigueiros, não contamino mais minha vida com nada que não seja feito de luz e amor. Todas as políticas do mundo são feitas através do ego, todas as decisões do mundo são tomadas por homens que só conhecem a mesma arma, eles desconhecem totalmente a razão da alma. Eu não aconselho ninguém, porque minhas palavras são secas e diretas, elas não agradam e nem fazem casa onde o ego se mantém. O ano de 2017 passou entre dificuldades enormes nesse meu aprendizado diário que é ser mãe, porque é algo do qual não me dissocio facilmente, é um título que ninguém mais quer carregar, é uma responsabilidade que dói, cansa, e priva dos maiores confortos terrenos. Ser mãe me trouxe para um lugar onde não há luxúria, egoísmo, nem vaidades. Assim como o amor que eu tinha pelo Chicó se estendeu por todos os seres do reino dévico, o Amor que eu sinto pelo Caê se expandiu por todas as crianças do mundo. E agora nada mais importa, todas as ideologias e filosofias que não visem o bem estar destes espíritos frágeis e dependentes de nós seres adultos e capazes, me importa. A humildade eu só vim conhecer agora. E humildade eu entendo pela incapacidade de criticar qualquer forma de vida, incapacidade de culpar o outro, de questionar os motivos alheios, de identificar o que o outro faz como não sendo direito. Eu sei o que eu não sei do mundo, e isso já me basta. Hoje aos 27 anos, em 2018, após dez anos de estrada, eu posso dizer que como ser humano estou evoluindo dentro das minhas possibilidades, eu reconheço os meus fracassos sem dor, eu vejo o meu presente e o meu futuro sem medo. Já tenho ideais que se cristalizaram em minha compreensão de mundo e só mudarão quando eu for capaz de enxergar as coisas que ainda não vejo, com meus próprios olhos, ou melhor, com todos os meus olhos. Eu sou imensamente grata pela trajetória que escolhi, por todas as passagens até aqui, da minha capacidade de discernir e perdoar, eu sou grata pelas pessoas que me acolhem em seus corações e me leem como eu realmente sou. Sou grata pela minha família que me ama mesmo não me conhecendo como eu gostaria, que compreende pouco os meus desejos, mas me apoia e não interfere neles, e porque foram eles que me ensinaram a amar todas as vezes que me dão amor, e me recebem em seus lares com um sorriso que muitas famílias desconhecem. Eu sou grata por nesses 27 anos nunca ter passado pela fome, pela doença, por dificuldades que não conseguem ser superadas. Eu agradeço pelo avanço da tecnologia e  suas facilidades. Eu sou grata pelos professores que amam, porque sem isso, o sistema de ensino morre. Eu sou grata ao Arnoldo que me acompanhou esses últimos dez anos da minha vida, e fez dela o mais agradável possível, mesmo que pra ele o sacrifício não fosse leve. E agradeço por tê-lo transformado inteiramente assim como ele me transformou.
Hoje somos uma família cheia de amor, filosofia, histórias incríveis, espiritualizada e sem religião.
O que eu deixei para depois dos 27 é um sonho grande de ver o mundo despertar e trabalhar ferozmente para acordar quantos espíritos eu puder sem imposições. E deixei sonhos pequenos, realizáveis com um pouco de trabalho físico e intelectual.
Eu nunca pensei que escreveria um texto da minha vida sem sentir dor, sem sofrer, e o que me surpreendeu nesse processo foi exatamente isso, esse balanço me mostrou que a forma como eu lembro da minha vida é extremamente feliz e cheio de boas energias.
Esse texto era para ter sido acabado ontem, no meu aniversário, mas ficou pra hoje e só consegui concluí-lo porque meu marido está em casa e deu conta de tudo sozinho. São quinze horas de escrita contínua. Não tenho pique para corrigi-lo. conforme o tempo for passando, eu vou revisando e recuperando algumas coisas esquecidas.

Vozes desde 2016 até hoje: Bita, onça felinda, palavra cantada, turminha paraíso, canções da fazenda, Céu, Alceu Valença, Francisco el hombre, Bethânia, e por aí vai.

Obrigada aos que chegaram até aqui. Não é um poema, é a história dos últimos dez anos da  minha vida. Tentei ser o menos prolixa possível, imaginem, caber tantos anos em duas páginas apenas, é de cortar muita história fora.

Bem, tenham uma boa vida, e espero que tenham forças para fazer um balanço de seus idos queridos também, daqui dez anos escreverei um novo balanço e então terei duas décadas de registro para os meus já então jovens sobrinhos e filho se deleitarem ao conhecer, a pessoa que eu fui, sou e serei.

Bisous.

Juliana da Silva. 27 de abril de 2018.



domingo, 15 de abril de 2018

haverá um lacre no meu coração?

Bonjour leitores e amigos, um poema para o domingo.

Será você? O lacre no meu coração.

Teus olhos ainda voltam a me espiar, eu sei.
Hoje você veio me encorajar.
Sua fisionomia era como a da última vida.
Cabelos louros, rosto forte decidido.
Sua corpulência é a mesma de todas as vidas.
Seu abraço apertado em minha cintura foi o mesmo da última fuga.
Mas na última vez eu não estava pronta para o teu abraço.
Escorri ainda um pouco pelo lado.
Mas hoje se teu corpo me enlaça, 
eu abro as minhas asas e te elevo aos céus.
E juntos arracacamos todos os lacres do meu peito.
Libertando minha dúvida e meus fracassos.
Costurando juntos um novo itinerário.

Arranco para você o lacre que me segreda.

E deixo sua alma penetrar nos mundos omissos do meu ser.

Nada resistirá ao seu toque.

Nenhum neutrino me alterará.
apenas a chama acesa de seus graves olhos me farão rolar escada abaixo e implorar pra nunca mais renascer neste mundo sem te reconhecer.

Juliana S. Müller.

terça-feira, 20 de março de 2018

Vai(a)idade.

Bonjour leitores e amigos, o poema de hoje é um dos bons. Geralmente eu posto qualquer poema que eu escreva, mas ultimamente tenho guardado muitos, por não saber o que fazer com eles. Talvez arranje-os em um livro, mas não os deixarei assim por muito tempo, poema não serve pra ficar engavetado. Para as gavetas nos deixamos as traças e os ratos. Para os poemas nós esperamos o contato com as mentes e os corações do leitor, e quem sabe uns minutos de salvação.
A arte só salva momentos, que podem ou não permanecer em nós por alguns dias, em mim permanece somente o tempo de escrever e sonhar. Depois, esvanecem-se e os esqueço. Um dia retomo e já não tem o mesmo tom nem o mesmo impacto, o que me mostra o quanto a arte é indiferente ao que se propõe. A assimilação sempre dependerá do contexto que o leitor está inserido naquele instante, então é interessante a ele, ou insignificante.
A beleza da mutação e da efemeridade da arte é pra mim uma droga alucinante.
bisous caro leitor.

20 DE MARÇO DE 2018

Toda a construção em mim vai descascando pelo tempo,
Sem uso, 
aos poucos tudo vai se perdendo.
Eu não lamento
O empenho nas aulas de francês.
Os discursos literários.
O pensamento complexo
e os formalistaS operários.
Todas essas gavetas foram fechadas.
E quando abro, encontro nada.
Só restaram as etiquetas e pastas acumuladas.
A promessa de uma retomada.
Não ouso.
Não faço a manutenção da minha obra.
Deixo as horas corroerem tudo.
Todo pensamento filosófico,
Todo sentimento saudoso dos prédios,
Toda a artimanha artística dos versos.
Não recupero.
Esqueço todo o resto.
E como uma criança recém acordada
Inicio tudo desde o começo.
Com o sentimento puro de quem olha pela primeira vez o mundo.
Sem medo,
Sem teorias,
Sem conversas abstratas.
Apenas o sentimento de existir no mundo.
E exprimir nos versos cada sensação de descobrimento.
Explorando lugares nativos da minh'alma.
Enquanto as paredes do meu cérebro se desmoronam.

Todos os ruídos que o homem faz, me ensurdecem.
Suas falas, suas marchas, suas vestes,
Tudo me enfurece.
E como criança que sou,
chamo pela minha mãe.
Não quero Bakhtin nessas horas.
Foucault ou qualquer outro teórico que franza meu cenho.
Quero apenas o riso sincero, 
que só me arranca da carne 
os que não foram comidos pelo cemitério.

A vaidade é um sentimento que só merece desprezo.
Não me apego ao texto.
Não me apego ao EGO.
Não tenho ódio aos nomes que cito.
Só tenho um desejo.
Ser ninguém.
e nisso não há exclusividade.
Nisso não há méritos.

Juliana S. Müller

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Dos arrebatamentos que encontro na minha jornada, conhecer a histórias dos grandes avatares é uma mesma sentença dada de diferentes formas. A cada grande gênio, encontro um pouquinho do meu fracasso, da minha trajetória terrestre, e sinto as mesmas feridas, e vejo a mesma sociedade não compreendendo as diferentes formas de viver e sentir o mundo. Vejo os mesmos bloqueios sociais, e as estruturas que as instituições construíram e engendraram de tal forma que continuam a barrar e desacreditar os grandes espíritos que aqui tentam a sua jornada.
Não me compararia em brilhantismo a qualquer um destes deuses, mas conhecer os seus fracassos me faz tão gloriosa e crente de minhas capacidades quanto qualquer grande obra. O não domínio de mim mesma talvez seja a grande paleta de cores da minha alma.

Tenham uma linda semana.
Bonjour.

28 de fevereiro de 2018. quarta-feira

Ela sente tudo!
Ela sente tudo agudamente!

Essas palavras saírão um dia de ti.
Enquanto suas bocas emudecem
Eu assisto as minhas histórias nas telas de Vincent.
Ainda não domino suas cores, 
mas já as deleito em meu vocabulário.
Então um gênio em carne sentiu o mesmo que eu.
Então um gênio em carne comeu do mesmo prato que um ser desbotado "comme moi"?
Sim.
Enquanto me aflijo em inúmeras loucuras.
Enquanto me encerro em inúmeras dúvidas.
Vou me tornando cada vez mais Van Gogh.
Quando menos me encaixo no mundo carnal
Quanto mais amo todas as vidas deste mundo
mais vejo em mim seu retrato de moribundo.
Vincent, em que momento da minha jornada me tornei você?
Por que demorei tanto para em ti me conhecer?
As pessoas sempre chegam na minha história
quando o meu personagem parece sem trajetória.
Então as suas glórias me fazem crer novamente na minha própria prova.
Nas cartas que envio com o calor das horas.
Nos arrependimentos que não tenho pelos amores secundários, efêmeros,
que me fazem mais poeta do que em horas sórdidas.
Quando menos quero ser alguém.
Quando me declaro oficialmente ninguém de lugar nenhum.
Quando treino essa resposta aos mestres e me acho tola.
Encontro um Vincent que foi ninguém, e morreu como louco.
Amado por poucos.
Uma obra duvidosa.
Uma vida de ostracismo, fracassada.
Um homem que qualquer luz adivinharia sua morada.
Um gênio que calava dentro de si a sua glória.
O que devo pensar eu de mim?
Todos os quadros pelos quais passei, distoei.
E essa tela em branco em que me anulo todos os dias,
será a inscrição de uma glória vinda?
Todos os rostos cheios de louvores me passam a mente.
E vejo meu retrato completamente distoante,
um currículo vazio e uma alma desconcertante.
Devo eu temer por me tornar um Vincent,
envergonhando os que amo e vivendo de cravos.
Não construo eu um paradoxo pra esse caso.
Não me encorajarei jamais a ser como o todo.
Viverei só e louca, mas jamais BEBEREI da ganância dos povos.
Enterrei minha última partícula do ego,
quando aceitei vexada aquele trabalho escravo.

Agora sou livre.
Agora sou Vincent.
Não tem jeito,
nasci de novo
um outro tempo
mas o mesmo ovo.
Vou morrer com o mesmo sonho.
Vou tornar-me gênio póstumo,
de um outro povo.

Juliana S. Müller

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Só penso em você quando estou no período fértil.

16 de fevereiro de 2018

Será você? O lacre no meu coração.
Teus olhos ainda voltam a me espiar,
eu sei.
Hoje você veio me ver.
Sua fisionomia era como na última vida.
Eu sei, os tempos eram outros,
mas a ousadia do amor, a mesma.
Você veio ao meu encontro, com tanta coragem
Que eu não vejo possibilidades de dizer não.
Toda a sua corpulência séria, se desfez nos meus braços.
Quando você me pegou pela cintura, 
os nós dos meus laços se desfizeram em volta do teu pescoço. 
E eu soube que era o mesmo abraço daquela nossa última fuga.
Mas da última vez, eu não estava pronta.
Escorri entre nossos corpos e fiquei de lado, pesando a culpa.
Hoje, nenhum pensamento me perturba.
Quando suas asas enroscam nas minhas, eu me deleito em seu voo
E viajo para os extremos intocados de nossos amores interrompidos.
Você arranca os lacres do meu peito,
e liberta toda a existência dolorosa de uma dúvida.
Inspiro com meus lábios colados nos seus.
Nosso primeiro beijo,
nossa última vida.
Nos amaremos do outro lado do espelho,
Pois deste lado, já queimamos as nossas fichas.

Juliana S. Müller.

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

A era da luz.


29 de janeiro de 2018.

Não há passado,
há uma história constante
e tudo vive em mim.
Nada fica para traz,
tudo vem comigo
na experiência e na memória que é eterna e essencial.

Hoje despi-me de mim mesma,
e olhei aqueles álbuns antigos
com a curiosidade de outrem,
e descobri um ser celestial.
Como não invejar aquela menina
Toda a felicidade de uma vida mora ali.
Aqueles olhos não conhecem lágrimas
Aquela boca nunca despejou palavras odiosas.
Notadamente sua vida é grandiosa.

Quem merece tanto amor?
Quem é que pode ser tão feliz aqui?
Ela não parecia desta pátria,
Suas cores áuricas não são daqui.

Aquela jovem sorridente
com a língua de fora,
com a vida que um dia eu almejei pra mim.
Quem é essa jovem tão intocável,
completamente alheia a tudo o que é vil?
Ela, personagem de minhas histórias,
tão sábia de suas escolhas,
tão teimosa em seu caminho,
quem a concebeu assim?

Se me recordo bem,
essa jovem destemida
com ar de menina de fora
que esbanja estranheza e amor,
é essa velha que hoje vos fala.
Uma senhora completamente perdida
entre suas idas e suas vindas
esquecida de suas amigas
e repelida de qualquer honor.

Essa menina mora em minha casa,
me visita quando a força me falta
e me pede calma em dias de estopim.

Ela não entende que aqui dentro há uma falha,
um desastre geológico que a esta altura irrompeu em mim.

Seus olhos me espiam e sua voz me acalma,
Mas basta para que ela se vá
pra que eu me perca completamente e
volte a sentir o mesmo aperto chakra
Onde antigamente repousavam os querubins.


Não importa se ela vai e volta,
Eu fui ela um dia
e me orgulho de sua história.
Uma moça tão digna e de preceitos,
não pode terminar sem um final feliz.

Eu te disse que essa trajetória
não te traria glórias,
e que um belo dia
tudo estaria por vir.

A cada sete anos, giram a roda samsãra
E arrancam as máscaras que você
Não mais usará, quando enfim se despir.


Não me decepcione menina,
o mundo te aguarda
e enquanto você se prepara
eu cuido da tua casa
até que você saia novamente do livro
e mostre ao mundo o sorriso que ele merece saber.

Fecho o álbum de fotos,
com a sensação de um passado remoto
Que me sacode qual terremoto
E faz meu presente se ressentir.
O intelecto amadurece,
o espírito rejuvenesce.
Não fosse a vida assim,
Não saberia eu amar o fim.




Juliana S. Müller. 

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Ato 5 da profecia. O fim do ciclo.

29. 01.2018

Eu já li tudo o que eu poderia ler sobre o fim do ciclo.
Todas as possibilidades de como essa transição aconteceria, e já vi diante dos meus olhos o céu despejar todo o tipo de desgraças.
Hoje após viver a morte com a queda de um meteoro, encerrei meu ciclo apocalíptico.
Eu sei, ele virá tão certo quanto o respirar, porém eu, não mais desperdiçarei energia , nem lutarei contra a realidade dos dias cotidianos. Voltarei novamente meus olhos para o que faz meu coração vibrar, para a literatura da minha vida. Para as leituras que me transportam para meu verdadeiro eu.
Se me dissessem que nunca em outra vida eu li poesias, nunca fui cantora de incríveis melodias, eu negaria. Não acreditaria porque sinto em cada célula de meu ser essa eterna sinfonia de letras e ritmos que me tocam todos os dias.
O dia que o fim vier eu estarei pronta, com os olhos postos no mais belo livro de versos.
Espero ser a centelha de amor do meu próprio ser.
Amém.

Juliana s. Müller.

quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Ato 4 da profecia. olhares permissivos.


25 de janeiro de 2018

Todos os massacres estão sendo ignorados.
Ninguém para os senhores da guerra.
Todos têm olhares desatentos, 
Todos os umbigos centralizados.
Nunca o ego foi tão globalizado.
Ninguém mais pede pela paz mundial,
Todos compactuam com o CAOS.

Todos os conflitos já foram instaurados e inflamados,
Uns fanáticos, 
outros mercenários.
Nem mesmo os argumentos foram validados.

A guerra se faz com armas,
mentes vazias,
e capachos.

Em verdade vos digo,
Não vejo nenhum de nós impedindo o fim,
Estamos todos alimentando este triste cenário.

Nós ainda não enxergamos o astral e
ainda vemos nos objetos o status.

Não vejo sinal de luz,
só vejo sinal de fogo.

Meus olhos não criaram essa ilusão,
Eu vi o sinal nos desencarnes desenfreados.

Todos os dias um tremor de terra,
todos os dias um vulcão em colapso.
Todos os dias um novo conflito instaurado.

Desta vez ninguém ousa nomear o mau instalado.
Informantes desviam do óbvio,
leitores não conectam os pontos.
O intelecto foi comercializado pelo telefone móvel.
As discussões giram em torno de quinquilharias sem propósito.

Nas bocas, músicas vexatórias ressoam em coro.
Nos olhos, o reflexo dos corpos pré-fabricados.
Nos pés, o chão estéril, um solo seco e envenenado.

E vocês não perdem tempo com o mundo,
No entanto não há mesmo tempo.

Suas cegueiras os fecharam em um baú de aço.
E o relógio marca um minuto para o nosso fracasso.
Quando as doze badaladas do relógio ressoarem,
Todos viraremos destroços.
E a história será contada lá do alto.
Enquanto todos encontram uma maneira de não serem exilados.

Em verdade vos digo,
Enquanto voltamos nossos olhos para vislumbrar o por do sol,
no outro lado  do horizonte há um corpo despedaçado.


Em verdade vos digo,
Quando nos virarmos com horror para olhar a grande guerra,
nossos pés já serão capazes de sentir o tremor de Terra.
E então finalmente, só sobrarão as pedras.


Juliana S. Müller

sábado, 13 de janeiro de 2018

ATO 3 da profecia. O homem primitivo continua no poder.



Nada muda no mundo,
quando nada mudou em nós.

Eu refleti os reflexos que há em vocês,
e vi só o conflito crescendo.

Em seus olhos há medo,
Em seus corações desejos.
Em suas mentes conceitos velhos e robóticos.
Vocês não pensam,
Vocês realmente não sentem.
Vocês nem mais vislumbram a realidade.
Vocês estão muito longe de encontrar as suas verdades.

Eu vi tudo isso apenas olhando para vocês.
Eu vi o fim de uma era, apenas observando seus passos.
Não eram passos.
Eram corridas do ego.

E nada do que dizíamos esclareciam as suas ideias.
Vocês afundaram demais a cabeça na areia.
Desligaram-se da nossa tomada.
E durante milênios os avatares falaram, criaram,
e vocês ainda não encontraram o que há dentro de vós.

O conflito não pode mais ser tolerado.
Seus espíritos já estão velhos e gastos.
Não servem mais para explicar seus atos falhos.
Eu amo todos vocês.
Amo a forma como são capazes de construir o mundo.
Amo os perfumes que criaram,
os incensos que acendem ao meditar.
As cores de seus tecidos.
As músicas e toda a arte que são capazes de criar.
Mas vocês são livres.
E quando pegam no tacape tornam-se ogros.
O mundo não suporta mais esse instinto áspero .

Vocês serão libertados deste fardo,
mas não esqueçam que a vida continua deste outro lado.

A salvação só existe na tradução dos seus medos mitificados.
Não há ninguém capaz de te salvar do seu estado devastado.
Só os seus esforços serão considerados.
Não terceirize sua própria história.
Tem um homem anotando o caminho de cada divina alma.

O mar resgatará muitos de vocês agora,
enquanto a terra engolirá a outra parte que não gosta de água.

Não prometam e nem peçam nada para seu próximo ano de vida.
Comece agora a meditar e a pesar o que você fez desta sua jornada
e me conte como você fará para livrar sua alma,
se ainda nem conhece as leis que te guiam?


Juliana S. Müller.

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Ato 2.

Acompanho seus passos como uma viciada acompanha sua droga.
Todas as notícias são a seu respeito.
Tudo neste mundo nos leva a esse encontro fatídico.
A espera solitária pelo fim dos dias é uma provação.
Vejo o seu rosto em todas as catástrofes diárias.
Só há desastres, nada de calma.

Eu vasculho pela internet tudo que me desminta você.
Mas não há um único livro profético que te altere.
Você é a única escolha desta geração.
Corremos nesta guerra-fria, com todas as armas nas mãos.

Eu não participo deste fim.
Minha ação será no início do ciclo.
Enquanto isso dobro os joelhos e clamo ao homem.
Mas o homem dorme o sono profundo.
Só vejo sua face em meus sonhos.
E a cada vez você se mostra diferente.
Me confunde, mas jamais  se desmente.
Mas agora você não me assusta mais.
Não importa a violência com que apareça.
Já é conhecida a tua obra.
Já é conhecido o nosso fim.

O calendário será queimado em breve.
E as horas não serão mais sentidas.
Quando o teu hálito quente abraçar nossas almas.
Todos os rostos se voltarão para o chão.
Mas eu te olharei nos olhos,
eu que contigo me familiarizei.
Não questionarei a tua ira.
Apenas irei meditar em face das estrelas.
nada sobrará nesta Terra que seja capaz de nos abrandar.
Mas eu prometo a você, que não irei desatinar.
Seguirei com o planejado,
e enquanto você estiver sacudindo os trópicos
eu já não estarei mais lá para te interrogar.

Lamentarei por nossas terras,
lamentarei por nossos amigos.
Mas bem sei que haverá pouco para lamentar.
Além do mais, há refúgio bastante nos teus céus.

Mas eu,
esperarei que tua tpm passe bem longe do teu mar.
Sei que na minha toca de índio você não irá me encontrar.

Dormirei sob o teu céu tenso.
e me acalentarei na fogueira dos auto-escolhidos.
Não disse que não tremerei com teu humor destruidor,
apenas não cairei sob teu mar,
nem afogarei nas tuas lágrimas.
Não tropeçarei nas fendas de teus tremores,
nem serei engolida por tuas terras.

Você me sacudirá de cima a baixo,
mas lá no centro, sei que terei lar.


Juliana S. Müller

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

Ato 1 da profecia.

05 DE JANEIRO DE 2018. sexta-feira

Não tenho mais ruminações.

apenas espero.
imagino.
baseada nas profecias antigas aguardo.
Sei qual estrada me levará à Terra prometida.
Muitos dedos me apontaram a direção do alto paraíso,
e mesmo que teus pés empaquem aqui, eu viajarei para lá.
já descobri nosso futuro nas linhas dos homens desencarnados.
Muitos me contam sobre nosso futuro escasso.
Eu não duvido. 
Decido não encontrar trabalho.
sou livre.
Ser livre é que é ter trabalho.
Quando tua mente se abrir como castanha. 
Verás que das loucuras que te conto.
Não há uma que não deva ser encarada com urgência de Estado.
Não entendo.
Por que de tantas cabeças pensantes,
a minha é que tem que conhecer o destino tão claro?
Se todos esses meus amigos raros,
imersos em suas ilhas paradisíacas se afogam no raso,
e eu conhecedora de seus destinos me calo. não falo.
Quem sou eu? 
Eu sou alguém?
Ninguém me proíbe, 
apenas minha lucidez social me impede.
Se eu falasse eloquentemente sobre nosso fim,
todos ririam, chorariam, teriam pena de mim.
Mas ninguém me seguiria para o centro do país.
Seria eu e nosso filho, 
dois corpos fugindo para o prelúdio da transição.
Quando o relógio marcar 142018. 
já não estaremos mais aqui.
Observaremos através do espelho d'água,
toda a massa da terra ruir.
Só restarão as montanhas que aguardam nossos pés
só estas permanecerão intactas, para que possamos subir.
Enquanto avistamos ao longe as águas fluírem até aqui.

Juliana S. Müller


quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Só escrevo para você quando estou bêbada.

se eu voltar será para te olhar nos olhos.
mesmo que eles sejam repugnantes.
Mesmo que o tempo entre você e eu tenha queimado os amores,
os versos persistem, foram feitos para a eternidade.
em todos os cantos dos multiversos o nosso sopro de poesia vai estar.
Para aonde eu for, levarei nossos poemas comigo.

Mas eu não volto, você sabe.
Por isso não me responde mais.
Um dia desses apareço na tua página
e então você terá que me encarar, cara.

Vai olhar para dentro do meu corpo
e extrair do meu sangue o vinho que te embriaga
e te instiga e te faz querer escrever sem parar.
De mim você não vai se livrar,
Não sei quantas musas receberam suas juras de amor.
Mas poeta tenho certeza. Uma.

Você vai voltar,
e quando voltar terá um livro pra descobrir.
Em seu nome.
Você será conhecido pela pela mão da Musa que te pariu.
Você será ridicularizado pela poeta que o feriu.

Você se esconde em todos as sombras do existir,
mas nos versos te acho, e me encaixo ao seu lado.
E te espio daqui da minha cama,
Te reprovo. Você não vale mais do que essa noite de histeria.

Eu não tenho como voltar,
vocÊ entende?

Fui outra, uma Deusa, uma moça
com a qual eu mesma casaria,
Hoje sou pranto que eu jamais encararia.

Sorte tua ter ficado com a Musa,
A poeta não vale mais do que essas linhas.

Juliana S. Müller.

O encontro

Eu vejo o seu nome Percy,
uma, duas, três vezes na mesma semana.
Até muito pouco, você não exitia.
Agora se mostra e me chama para segui-lo naquela trilha.
Eu vou.
Levo somente a vontade de encontrá-los.
Me oriento pelas pegadas que você deixou na Terra.
Encontro sinais, eles me bastam.
Não temo a morte pela boca dos índios.
Eles me reconhecem, eles me esperam em suas ocas.
Eu alimento o meu corpo e purifico meu espírito.
Os protetores do antigo templo me preparam para a sua chegada.
Eu sorrio, eu levito.
Eu não destoo do que vejo, eu me replico neles e eles me beijam.
Depois de dias naquela tribo,
experimentando nenhum medo.
Me deixam ir.
Me passam coordenadas que eu não compreendo.
Continuo seguindo seus passos Percy.
Não me perco, na selva eu vejo com os olhos das aves.
E a intenção que me move é ancestral.
Vislumbro nossos amigos de pele dourada e cabelos negros.
Olá Percy, sabia que viria para a minha chegada.
Obrigada pelo chamado.
Você continua fazendo história.
Entro para o centro da Terra.
Percy apenas me encara.

Agora vocês me procuram,
e eu não quero mais nada.
O que meu corpo experimenta é a recordação,
das cores, dos cheiros, das sombras e do sabor d'água.
Eu penso em vocês que pisam em nossas cabeças.
E não acredito na verdade que vos falta.
Eu levito como bolhas de sabão e vocês rastejam como cobras.
Não sinto pena, não sinto.
A estrela que brilha aqui incendeia as nossas almas.

Eu sento.
penso no meu filho, choro.
meu coração fala com ele todos os dias.
ele sabe da minha partida.
ele me ouve e me procura.
eu não posso buscá-lo,
mas estarei esperando no portão,
e quando chegar até aqui, nossa família celebrará o grande encontro.
Seu acento está esperando pelo seu aconchego.
você já se aproxima de nós.
Quando encontrar o caminho na selva, não regressará jamais.
Enquanto você não vem,
eu te nino em meus braços,
te conforto e aconchego.
A vida é bela demais com você por perto.
Transbordo, rebento.
repenso.
A vida é demais com você em meu templo.

Juliana S. Müller. 

quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

Califórnia queima.

Bonsoir amigos e leitores queridos. O poema de hoje é refrescante e apaixonado.
É bom relaxar no meio de tanto caos instaurado. Quem acompanha as notícias do mundo, sabe que estamos cavando um imenso buraco. Contudo, nada termina aqui, sempre haverá outros pontos, e vírgulas até o ponto final. Então vamos relaxar o espírito com um pouco de liberdade poética.

beijim e um ótimo dia para todos que me lêem e para os que acompanham a minha escrita.


07 de dezembro de 2017. quinta-feira

Primeiro eu conheci a Califórnia pelos olhos do cinema Americano.
Eu gostei, mas não me apaixonei.
Depois eu conheci a Califórnia através da era hippie,
simpatizei, sintonizei, mas não me apaixonei.
E por último e muito mais alarmante,
conheci a Califórnia pela língua vulgar daquele velho traumatizado.
Ele fez o que todos que me seduzem fazem;
Me chocou com a sua infeliz realidade.

Me convenceu a viver em um quarto miserável,
e me desprender de qualquer ordem e sanidade.
Ele me libertou dos meus pudores cristãos, 
e me deixou cara à cara com o meu escárnio.
Andei pelas ruas dos guetos de Los Angeles,
ouvi todas aquelas sirenes invadindo a cidade.
Conheci os cenários mais sórdidos, e me acostumei
me apaixonei por essa vida à revelia.
Foi pela voz rouca embriagada do velho intrépido,
que me apaixonei definitivamente pela Califórnia insolente.
Mas como todo amor tem um fim trágico...

Califórnia foi vendida para a tecnologia,
e os velhos hippies de trajes nada sofisticados foram vilipendiados,
assim como a harmonia entre, cultura e mercado, divorciados.
Hoje minha paixão queima, 
ardem as labaredas por todos os lados.
Em comum acordo entre hippies e nativos,
decidimos que nossa história teria um fim memorável.
Incendiamos a Califórnia.
Enquanto acendíamos o nosso último baseado.

Juliana S. MÜLLER.

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Pensamento diário

SEXTA-FEIRA dia 01.12.2017

Ela sentou na varanda e esperou,
De repente o pensamento veio.
Era meio da tarde, o bebê dormia.
Ela aproveitou o momento para pensar,
lembrou imediatamente do filósofo que dizia,
"trabalho enquanto repouso, descanso enquanto carpino".

O trabalho é ofício de todos,
nem todos têm reconhecimento,
uns são pagos com ouro,
outros com linchamentos.

Esses versos ela fez foi de momento,
Tem dias que a veia é solta,
outros estancada como pavimento.
Hoje ela estava com o tempo livre para ser.
Mediu as últimas notícias do dia,
e sentiu que não valia o sofrer.
O mundo não acabaria com a vida,
mas a vida de muitos iriam padecer.
Ela só pensava na lista de compras,
e onde estocar tanto alimento sem ninguém perceber.
O importante era manter o corpo aquecido,
e a barriga das crias cheias por longos anos.
Na verdade só os mestres saberiam como tudo ia acontecer.

E foi esse o pensamento do dia,
Não adiantava mais maquinar a salvação do mundo.
Poucos sabiam,
mas em alguns meses toda a Terra iria escurecer.
Ela disso já entendia,
só não conseguia ainda era,
lidar com o espanto dos outros enquanto ela guardava em segredo completo,
a história que um velho lhe contara há muito tempo,
muito antes do bebê nascer.
Por alguns anos esquecera do narrado,
mas agora com as notícias que lhe trouxeram,
Não era difícil reconhecer aquela história  que,
se passava todos os dias perante seus olhos
 sem nenhum outro olhar atento para perceber.
Ela olhou para o céu azulado, e lembrou de fotografá-lo.
Seria importante que as crianças soubessem que,
o mundo fora um lugar agradável antes de toda a história da Terra anoitecer.

Lembrou de colocar mais um item na lista,
um casaco vermelho pro bebê.

Juliana S. Müller.

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

não há mais compreensão.

23 de novembro de 2017

Não há nada que eu diga que Drummond e Pessoa já não tenham dito.
Mas eu me repito.
Eu repito,
e a condição humana ressignifica a palavra.
E a condição mundana não entendeu o que eu falava.
Mas eu disse com exatidão,
e o que pareciam metáforas era a visão de um clarão.
Tudo se iluminou aqui.
Foram nascendo fagulhas,
que se transformaram em chamas.
E chamas ainda ardem em mim.
Mas ao contrário do sonhado,
não falo com alguém.
Meus poemas navegam por rios marginalizados,
e agora bifurcados pela correnteza,
só navegam em um único saber.
Não espero mais aplausos,
o que eu digo ninguém vai querer saber.
Eu mesma não quereria se os lesse sem me conhecer.

Mas eu me cavei poços fundos demais,
eu naveguei em rios isolados demais.
Ancorei em margens que não saberia narrar.
Conheci histórias que não me atrevo compartilhar.

E agora eu vejo meu barco indo só por essa bifurcação,
a correnteza não me permitiria voltar,
mesmo se eu ligasse todos os motores,
morreria náufraga e não voltaria pra lá.
O lado de lá é agitado,
o tráfego é intenso e seus tripulantes riem de mim isolada no hemisfério de cá.
Eu sinalizo com gestos amistosos,
insisto em mostrar a queda d'água que há logo à frente.
Todos riem dos meus signos,
não compreendem o que eu digo.
E saboreando seus banquetes,
gracejando dos humildes barcos que viajam ao meu lado
e que começam a se avolumar,
Os tripulantes do lado de lá urram
de nossa ingenuidade nas ondas fluviais.
Todos esperam ver nossos barcos afundar,
Mas enquanto se divertem com a nossa aparente fragilidade,
nós os vemos despencar queda abaixo.
Não houve tempo de se preparar para a queda.
O rio pelo qual conduziram suas vidas,
era demasiado veloz.
Nossos conselhos foram ignorados,
nossas previsões sobre o percurso rechaçadas.
Depois da bifurcação do rio,
nem o mais exímio tripulante poderá voltar atrás.
Até chegar ali, o rio foi longo e generoso,
e a escolha é a caneta que assinamos nossas sentenças,
mas...

Eles não entenderam que não se tratava de um jogo.
Era apenas uma verdade ainda desconhecida da maioria.

Não saberemos o que aconteceu com,
os tripulantes deste lado do rio.
Continuam a sua jornada com a certeza de uma longa vida.
Só isso não basta para quem tem no peito um baú,
mas como eles só desejam o trigo,
continuam nesta fase ainda, invictos.

Juliana S. Müller

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

09 de novembro de 2017. quinta-feira

Conta menina,
conta o que cala os teus lábios.
o que descabela teus dias.
Por que teus vasos transbordam?

Conta menina,
por que teus olhos vertem água,
tua respiração ofega,
teus pés marcham pela sala?

eu imploro menina.
mostre-me esse teu saber,
o que aflige esse teu ser
que transcende as páginas afora?

vamos menina,
abra esses teus versos,
não me deixe nesse buraco negro
mostre-me as palavras que te calam o ego.

Ela se virou,
abriu primeiro, seus dois verdes universos.
me encarou profundamente,
e gentilmente me empurrou até a janela.
Ali eu não vi mais que o de sempre.
Depois colocou em minhas mãos seus multi-versos.
E disse: dispo-me de tudo o que colecionei até hoje.
Não há metafísica em nada.

e assim encerrou sua fala.

me deixou com todas aquelas constelações, galáxias,
tilintando em meu cérebro.

Eu demorei pra absorver seus multiversos.
Eu precisei morrer e renascer.
E depois de um longo tempo paralisado,
alonguei meu universo até os seus.
E não pude deixar aquela dor ali.
Eu gritei, eu urrei.
A dor impregnou em mim.

Você, estátua de buda encarnada,
só me observava, não me media.
Apontou-me a  mesma janela,
e o que eu vi foi desolador.
Não era o mesmo horizonte,
nem o mesmo sol ardia.
Pedi perdão pela minha ignorância.
Envergonhei-me da minha arrogância.
Eu nem mesmo sabia que a tinha.

Mas agora perante a sua benevolência
a sua paciência com o meu não saber.
Eu chorei, chorei, pela tua humildade de todo dia.
Como podia lavar pratos com tudo o que sabia?
Como conseguia sorrir para nós,
ao ser humilhada por não ser o que nossas palmas aplaudiam?

enquanto todos esses sentimentos rodopiavam em mim,
você sorria aliviada e eu soube.
Que a tua liberdade pela primeira vez não seria nomeada erroneamente.
Eu li nos teus ombros relaxados que não seria mais a LOUCA.
A amiga que todos olham com pena.
A mulher que nunca chegou a ser.
A que não é ouvida.
A que não move palha.
A ociosa que arrasta os chinelos.
A macunaíma.
A que não pensa no fu(tu)ro.
A que desperdiça dias.

Eu vi todos os dedos apontados,
eu presenciei as bocas gargalharem,
E as vozes sussurrarem teu nome com as desgraças de teus fracassos.

E agora que já não provocas,
Nem sai em tua defesa,
Agora que és muda.

Os falares cessam.
Os olhos interrogam.
Cada gesto procura não te desocupar.
Todos esperam que você fale.
Todos se calam pra te escutar.

Eu vi no horizonte do teu andar,
as luzes apagadas do mundo todo.
E as duas luas escuras no céu.
Você bem que podia ter dito: eu avisei.
Mas você calou seu conhecimento.
E agora você não lamenta.
Enquanto todos arrancam cabelos,
seus olhos brilham com as chamas queimando os desatinados.
Mas hoje eu sei que o riso não é escárnio.
O riso é a mudança que não admitimos.

Teu espírito ouviu as vozes da profecia.
e acalmou as angústias que te ensandeciam.

Agora eu entendo suas mudanças de humor.
seus silêncios inquebrantáveis.
Seus surtos de alegrias.
Sua ira com as mesquinharias.
E por último seu completo isolamento.

Eu assisti todos seus movimentos,
ainda assim duvidei do que viria.
Me afundei em três dimensões
as quais são corpo não mais imprimia.

Fui tolo, medíocre.
ignorei suas cartas.
Seus vídeos,
suas inúmeras falas.

O tempo não passa você dizia.
Eu acreditei que passaria.
Não passou, só completaram-se os ciclos desta vida.

Seus enigmas foram crescendo,
e inacessíveis se fizeram suas filosofias.
Quando os dias chegaram,
você estava plena, tranquila, agradecida.

EU.
histérico,
confuso,
incrédulo,
perdido,
sem rumo.

Foi quando você me pegou pela mão,
e em seu silêncio me contou o que eu não sabia.

Me mostrou seus inúmeros versos,
e então eu pude compreender
porque o mundo ruía.

Suas últimas palavras foram:
O mundo está em guerra, porque é espelho do interior do homem.
O mundo só terá paz, quando em paz estiver o homem.
Não deseje a paz, seja a paz.

Ela continuou com o mesmo semblante pleno.
Voltou a fazer seus afazeres domésticos,
enquanto eu, cego que sou,
gastei minhas últimas horas, devorando seus textos.

O homem agora, despertou.

Juliana S. Müller